sábado, 29 de novembro de 2014

A sexta de cada um

Hoje, sexta, por sí só já produz em todo o mundo ocidental um fascínio e regozijo ímpar
pelo que encerra, pelo que trás em sí de ânsia, mistério, expectância.
Sexta é o dia mais legal da semana, amigo camarada cachorro trem, como dizia o poeta.
Para os porras-loucas, como circulou em um áudio nos whatsapps da vida, é a "sexta-cheira".
Cada um desenha a sexta-feira a sua imagem e semelhança, ou dissemelhança.
A sexta dispensa apresentações, ela nasce com fogos e foco na alegria pagã de festejar.
Pobre segunda, terça, quarta, quinta... Ninguém tem olhos para elas. A rainha da passarela é a sexta, com seus "play me eyes".
Talvez a única sexta-feira que alguns não almejem, ou se o fazem é com um quê de proibido, é a sexta-feira 13, aziaga, cheia de presságios, lendas, superstições. Nunca tive medo dela. Mas que existe, sim, existe.
Olhar no rosto dos transeuntes, em cada bar, em cada padaria, em cada canto da cidade, numa sexta-feira, é poder perceber a felicidade plena e cintilante brincando de se mostrar. É como encontrar quem ame futebol logo após uma goleada sofrida pela Argentina, ou então a nova vilã, Alemanha. Aquela cumplicidade de amantes, de amigos verdadeiros, de estrela e lua numa noite de verão de céu límpido.
Diz uma lenda anglo-saxônica (mentira, apenas incluí isso para bafejar erudição) que para as crianças TODO DIA é sexta-feira. Por isso a infância é tão apetecida, tão cantada em prosa e verso, ungida de alegrias sem fim.
Sexta-feira é como encontrar um álbum que parece ter sido esculpido dos porões da terra inimaginada da imaginação especialmente para você, com cada melodia, cada arpegio, cada virada de bateria, cada refrão astuciosamente pensado para lhe provocar uma felicidade em forma de som.
Sexta-feira tem sabor de uma reviravolta que te traz de volta para o mundo dos vivos, quando parecia que no mundo dos sonhos tudo era ruína, desespero, medo, inexorável. É como acordar de um sonho ruim e saber que a felicidade está ali ao alcance do primeiro passo fora da cama e o caminho é a grande virtude da viagem.
A sexta tem um tão poder de insinuação e significado que Drummond, no poema, colocou o beija na...sexta feira!

Carlos, sossegue, o amor
é isso que você está vendo:
hoje beija, amanhã não beija,
depois de amanhã é domingo
e segunda-feira ninguém sabe
o que será.

Não deve ser mero acaso, não, duvido.
Sexta, como uma velha amiga que há muito não vemos, ou um camarada que se mudou e reapareceu para botar o assunto em dia.
Sexta como um belo e impactante filme argentino, com suas histórias e reviravoltas e a mostrar mesmo sendo feito sem grandes orçamentos podemos construir algo de valor.
A sexta pode ser da cor que você quiser pintar na verdade.
Eu preferi pintar como uma floresta tropical, plena de cores fortes e insinuantes ao olhar e aos sentidos.

Até uma sexta-feira cinza como esta, que levou Bolaños mas nos deixou na memória seus personagens carismáticos com sua doce e rara inocência.

Contudo, esta é uma sexta-feira.

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