quarta-feira, 31 de maio de 2017

Blog, esse diário ordinário e o tempo.

Os blogs nasceram com a função precípua de efetivamente ser mesmo um diário eletrônico e aberto, e sua função hoje extrapolou muito isso, servindo mais como uma plataforma de idéias dentre outras coisas. Pra mim serve de rascunho da vida mesmo, para refletir o que assisto, ouço, leio, penso, e assim poder até servir de ponto de "salvamento" de certas passagens da vida.
É sabido que o homem tem uma memória muito diferente quanto a acontecimentos, mormente afetivos, na forma de guardar as datas que aconteceram. As mulheres costumam ter uma memória absurda quanto a datas e as coisas associadas a acontecimentos. Estará lá guardado o primeiro passo de um filho, o primeiro beijo, etc. No homem as coisas não funcionam assim e pra mim pior ainda, que tenho uma memória muito, mas muito seletiva, de forma que ao ser perguntado sobre algo relevante de tempos atrás vai ser muito difícil eu conseguir lembrar e interagir sobre, meio que um personagem de amnésia do Nolan só que com um pouco mais de skill. Não está descartado um defeito de fábrica, embora consiga lembrar frases de filmes ou poemas, ou tirinhas de hq ou algo que valha. Sem querer comparar mas apenas pontuando, nas histórias imortais de Sherlock Holmes de Conan Doyle, o detetive tinha uma memória prodigiosa e uma inteligência absurda de associação para resolver crimes, em tudo que estivesse ligado a seu mister, porém nas coisas que envolviam, por exemplo, afetivas, ou de relacionamento, ele era sofrível, e deficiente por assim dizer. Mas poderia saber quantos degraus havia na escadaria de sua casa em baker street para futuras referências em algum possível caso. Seletividade.
Assim que uso o blog para compartilhar impressões de filmes, livros, músicas, dentre outros e também para me situar no tempo, e saber o que se passava na cachola na ocasião de postagem, já que o tempo não me pertence, mas as letras que uso para para fixá-lo no papel (eletrônico que seja) sim, como que o congelando no tempo, uma forma de não dizer adeus a coisas que são valiosas, então e depois.
Uma frase de Borges que sempre me fascinou aliás é que sendo "o tempo, essa vaga e ilusória convenção humana" foi uma forma esperta de compartimentar nossos enganos, nossos sonhos, ilusões, vitórias e derrotas, uma maneira que encontramos para não nos perder no fluir dos segundos que tem pernas maiores que nossa acuidade temporal de os perceber.
Quem também sempre falou das coisas do tempo, daquele seu jeito poético meio maroto, meio simples porém só na superfície, o que por vezes gerava certo desprezo dos ilustres letrados, mas que sempre foi e será lembrado pelas pessoas comuns que tem em sua mente sempre uma frase, um poema de Mario Quintana. Sua simplicidade e perfeita lapidação eram únicos, como em:

Se me esqueceres, só uma coisa, esquece-me bem devagarinho.

O tempo é relativo, dizia Einstein, cultor de belas frases, na sua teoria da relatividade. Sábato tinha um texto que tentava explicar a uma pessoa a teoria da relatividade, e foi simplificando-a cada vez mais para que seu interlocutor conseguisse apreendê-la. Por fim a pessoa, exultante, afirmou que entendeu a teoria da relatividade! Sábato, resignado, retrucou que agora ela já não era mais a teoria da relatividade...

Mas falava eu do tempo e sua relatividade, e nesse pequeno texto eis mais uma representação dessa peça que nos prega o tempo:

O tempo é muito lento para os que esperam
Muito rápido para os que têm medo
Muito longo para os que lamentam
Muito curto para os que festejam
Mas, para os que amam, o tempo é eterno.
Henry Van Dyke 

Drummond também em A Carta dizia que:

mas todos esperamos
rever-nos bem depressa.
Muito depressa, não.
Vai-se tornando o tempo
estranhamente longo
à medida que encurta.
O que ontem disparava,
desbordado alazão,
hoje se paralisa
em esfinge de mármore

O poeta moderno de maior expressão cismava sobre o tempo e seu irmão, a eternidade.

Eterno é tudo aquilo que dura uma fração de segundo, mas com tamanha intensidade que se petrifica e nenhuma força o resgata.

Alguns poemas nos perseguem, nos amedrontam, nos cativam e não consigo esquecer esse, de Dante Milano. Acho todo mundo um dia ou vários, quiçá, já se sentiu assim:

Saudade do tempo,
Do tempo passado,
O tempo feliz
Que não volta mais.

Deus queira que um dia
Eu encontre ainda
Aquela inocência
Feliz sem saber

Mas hoje eu sei
De toda a verdade,
Já não acredito
Na felicidade

E quando eu morrer,
Então, outra vez,
Pode ser que eu seja
Feliz sem saber!

Mas um último informe antes de acabar esse singelo texto: nenhuma hora, segundo ou minuto foi ferido na feitura desse rascunho, mas perdidos estão para sempre, prazerosamente onde ninguém estará.

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